sábado, 25 de abril de 2009

No supermercado

Andando pela rua. Centro da megalópole. Transeuntes fazem o que mais gostam: transitam. Juntamente com seus preconceitos. E me olham. De cima a baixo. De todos os lados. Me perseguem tão rápido quanto seus olhares conseguem. As idéias fervilham aqui e ali. Mas eles continuam me olhando. Paranóia? Ou nóias? Ah, isso tem bastante! Será que ser nóia é não perceber a vida que gira e desvira ao entorno? Então todos somos nóias? E despidos de pudor? Jamais. As esquinas se revelam cada vez mais cruas. E as pessoas continuam a me julgar. Me julgam com suas intenções ferinas e pecados insanos.

- Será que ele é?
- Será que ele não é?
- Mas será que ele é o quê?
- E será que ele não é o quê?
- Será que isso pega?
- Será que isso desapega?
- E se meu filho for?
- E se eu virar?
- E se eu for influenciado?
- E se eu for atacado?
- E se eu atacar primeiro?
- O que eu faço para não olhar?
- O que eu digo para não revelar?
- E aqueles homens sem camisa?
- Não posso olhar! É pecado.
- Não posso ser, nunca!
- E não vou conviver com a dúvida! Simplesmente não sou.
- E quem você é, então?
- Sou você estampado num retrato que ainda não foi tirado.
- Sou o mar, sou a lua, e ao mesmo tempo sou o tempo.
- Sou soma, subtração e subversão.
- Sou livre, sou homem, sou deus.
- Mas Deus não existe.
- Então crie o seu mundo e seja Deus.
- Mas eu só sei olhar...
- Então olhe para si e para o outro... e crie. Crie sem parar.
- Prefiro não ser a ser um deus criador.
- E se todos fossem deuses?
- Mas nós já somos... julgar é nosso principal passatempo.
- O tempo passa e a cabeça do feijão muda.
- Mas a cabeça daquele homem carcomido pelo tempo e pelo pudor...
- Já sei!
- O quê?
- Ressuscitou em mim a certeza de que amanhã não haverá olhares.
- E, por acaso, o mundo ficará cego?
- Não, a lua cansou de brilhar, e o homem terá de se reinventar.
- Sério?
- É sim.
- Mas com quem converso? Quem é você que me atormenta com estas vãs palavras?
- Sou você, sou eu, sou as estrelas. No fundo da sua inconsciência inconstante.

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