sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Necessidades

O que é certo? O que é regra? O que foi estabelecido? E por quem foi? Por nós? Desde criança? Quem disse? É sim. Então saia na rua pelada. Eu não. Nunca. Por quê?

Ué, mas eu mijo na rua. Mas você é homem.

E eu sou mulher.

Poizé. Ontem mesmo estava voltando para casa depois de tomar umas cervejinhas naquele bar ali [na verdade o bar era mais longe]. O ponto do ônibus estava vazio. Chovia naquela noite. Minha bexiga estava cheia já. Ninguém mandou eu abrir a torneira já no boteco. Mas eu não aguentei e coloquei para fora e fiz ali mesmo. Uma moça passou. De onde ela surgiu? Vai saber. Mas eu continuei no meu ato insano e descabido. Sim, descabido, mesmo sendo homem, a quem é legado vários privilégios. Fiz e desfiz. E fiquei satisfeito. Ah, como foi bom.

Foi tão bom quanto andar pela rua pelado. Ou nadar pelado no mar. Você já fez isso?

Então faça enquanto há tempo, vida e disposição juvenil.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Andarilho

São apenas e tão somente 455 anos. Pouco para uma cidade tão densa e complexa como a nossa. Com suas curvas, arranha-céus, vielas, periferias, centros, casarões, desigualdades, correria, pobreza, riqueza, contrastes, coloridos. Com o seu cinzento inquietante, ela vai construindo a hitória de muita gente e a sua própria. Vai armazenando formas de ser e permanecer. Mas nunca consegue permanecer em um único lugar. Pois ela é constante. A palavra transformação já perdeu o seu significado e daqui a pouco passará a chamar-se São Paulo. Escuta o que estou dizendo.

Mas são as crianças que me comovem e me inspiram constantemente. Seus sorrisos. Seus gestos singelos. Seus olhares inocentes. Assim como eu. Pretensão me comparar às crianças? Talvez. Mas entre eu e elas existe uma ligação tão forte que é tão natural e ao mesmo tempo estranha. Não é preciso fazer muita coisa. Simplesmente pareço ter mel quando chego perto delas. Outro dia mesmo estava brincando de esconde-esconde com uma delas. Pode uma coisa dessa? Pode. E como pode. Foi tão divertido, mesmo ela não sabendo se esconder direito. Eu sempre a achava com facilidade. Naqueles instantes eu só tinha quatro anos também. Voltei no tempo. No tempo que ficou guardado dentro de mim e talvez seja o meu grande tesouro. Não digo aqui de ficar relembrando e vivendo de passado, mas de guardar aqueles momentos que foram essenciais e inesquecíveis. Somos a soma de tudo isso.

Ah, o garotinho me olhou do trem que acabava de sair da plataforma. Ele ia no sentido contrário ao meu, mas ainda assim estávamos intimamente ligados, sem mesmo ter trocado uma palavra sequer. Apenas olhares tímidos. Ele devia ter, no máximo, uns sete anos. Naquele fugaz relâmpago [mais tarde começaria a chover] fomos bons e grandes amigos. Mesmo que o sorriso não tenha saído desabrido como costuma sair nestas ocasiões, ele entendeu que eu correspondi sua vontade de firmar uma amizade. Fomos amigos. Somos amigos. Levou uma parte de mim. Um pedacinho seu ficou aqui.

E o povo deste lugar, onde está? Em casa. A TV. Assistindo. Quem os assistirá? Até quando serão figurantes de seus próprios destinos [mesmo que eles existam só dentro de nossas cabeças]? Até quando o tempo será gasto na preocupação de não se molhar enquanto chove torrencialmente? É preciso tomar banho de chuva de vez em quando. É tão bom. E a vida é tão vulnerável. Amanhã já não sei se sou ou serei. Então banhe-se com o dilúvio puro e caiba em si mesmo de tanta felicidade.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Sereno

Sensato e embasbacado com o mundo, ele se levantou e quis continuar catando as migalhas no chão, que caíam sem dó nem piedade. Catava as folhas das árvores também. No inverno. Mas tinha folhas? Lá tinha. E também tinha um som diferente. Malemolente. Displiscente. Envolvente. Diziam que o dono do pedaço atendia por Miles Davis. Não conhecia, mas desde os primeiros acordes, percebeu que o homem não era só dono do pedaço, mas do mundo inteiro.

A sensibilidade encrustada no pedregulho que preenche o coração dos carrancudos estava paralisada. Diziam que era para sempre. Mas você sabe que nada é para sempre. As pessoas gostam muito de falar. Dois ouvidos para quê?

O suingue corre nas veias como a mais letal e estonteante e maravilhosa das drogas da vida. Sem moralismos e hipocrisias. A celebração com confetes está próxima.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Filme

Viver é dormir no trecho final do filme sem saber o desfecho. E depois dormir um sono gostoso enroscado nas cobertas, em uma noite gélida e aconchegante. E não ter hora para acordar. E ter como compromisso apenas o norte de seguir adiante, mesmo que não se saiba para onde o adiante irá nos levar.

Mas...

Não é preciso, nem recomendado, que se faça da vida um filme, para ser assistido de camarote ou na melhor poltrona do cinema. O filme é o trajeto realizado todos os dias. Todos são despropositais. No mundo não há sentido. Nós é que damos a ele ordem ou caos.

Caos...

Ordem...

Nada.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Ralação SP

O grande barato do desejo está em ser desejado.

As texturas puderam ser sentidas ao vivo. As relações são muito mais verdadeiras quando colocadas lado a lado de forma contundente e real. A realidade, ou uma das realidades, é possivelmente a melhor forma de se viver nesta cidade.

Nesta cidade que me transforma e me inquieta com suas sombras. Suas feições. Sua falta de senso. Sua forma disforme. Sua beleza obtusa. Sua dureza carinhosa. Seu carinho obsceno. Seus prédios infames. Suas construções distintas. Sua aura de vivências.

Fico até zonzo só de pensar no que é viver nesta cidade...

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Longevidade

Ser perene é perceber que tudo está perecivelmente fadado ao cansaço das tentativas mal-sucedidas e sacudidas por ondas que cobrem tudo aos borbotões, sem pestanejar e sem respeitar a pequenez da existência humana.

As máquinas, lideradas pela TV, vão liquidar e dominar os homens. Verbo no futuro, pois ainda não é hora da dominação imunda e completa e imune a contra-ataques. Oh, pobres mortais. Nós!

domingo, 18 de janeiro de 2009

Grandeza

Mas agora eu estou é emocionado com imagens vistas e identificadas com minha personalidade de tal forma que as lágrimas pingam de meu rosto frágil e comedido, e precipitado de emoções que não conseguem se esconder. Mas se eu sou assim, o que é que vou fazer?

O banheiro tinha as paredes pintadas de amarelo. Assim que olhei percebi e senti que ali havia muitas histórias para serem contadas. Secretas? Sim. Mas histórias. Levadas para todo canto por quem as viveu.

O mundo gira como um peão fora do eixo, como um brinquedo que fugiu do dono e não soube mais voltar pra casa.

O amigo permaneceu inquieto provocando revoluções permanentes e amores profundos.

A mulher chorava copiosamente. Ela me fez repetir o mesmo ato por dentro. Não havia lágrimas? Havia sim. Apenas não tinha coragem de mostrar em público, como ela fazia. As minhas lágrimas sagradas e perenes de erros e acertos, entrameados de vida.

A grandeza de ser aquilo que não se sonhou torna-se praticamente uma perseguição profícua e, ao mesmo tempo, inútil. A vida é pra amanhã. E o amanhã não existe, acredite.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Desejo de chover

A água invade o tênis. O escadão está inundado. Não chega a ser uma enchente, mas a água jorra intensamente. É cidade, não há terra por ali. Apenas casinhas simples. Muito simples. Mas cheias de alegria. Como a minha. Mas como eu estava dizendo: a chuva invade de tal forma que me faz gargalhar por dentro. E por fora também. É um êxtase que sobe e é tão parecido com a forma singular e serena de ser e se posicionar diante do mundo, que eu me enlevo na minha felicidade que não reclama grandes coisas e valoriza momentos tão pequenos. Estes são meus. Estes são eu. Estes são pra sempre. Mas o fato é que a casa continua serelepe e pulsante como sempre. As histórias e as memórias se somam a cada dia. A veia propulsora de tudo isso está de volta. Não imagino como seria sem ela. Mas por um momento coisas estranhas passaram por minha mente hoje. Como será? Quem irá primeiro? A vida é tão finita quanto um copo d'água no deserto. Por mais que tentemos aproveitá-la, sempre haverá um gostinho de quero mais. E talvez aí esteja o segredo do que é respirar a cada dia, seja com chuva ou sol, nuvens carregadas ou totalmente desabridas num verão qualquer. O sol. A lua. A chuva. A natureza. Não é complexo. Basta olhar com atenção. Basta olhar. E não se cansar.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Marcas

As marcas se embrenham na face como o machado cortando a lenha, como os traços que vão sendo desenhados no papel. Mesmo que o desenho não seja belo [mas o que é ser belo?], cada um vai construindo os seus contornos. O tempo passa, a idade chega e as marcas ficam para sempre. Depois se dissolvem. Mas ficam por muito tempo. Para uns, é apenas um detalhe. Para outros, aquelas pequenas rugas tornam-se um dramalhão mexicano. Mal sabe eles que são extremamente necessárias. São cheias de significados, emoções, histórias. E as marcas de infância? As marcas das peraltices. Você, com certeza, deve ter alguma aí pelo corpo. Na infância, eu gostava de brincar com fogo, até que o fogo um dia resolveu brincar comigo e deixou uma marca eterna na minha perna esquerda... Crianças: não misture plástico com fogo. Vocês podem se machucar. Mas se se atreverem, como eu, sejam mais cuidadosas. Ou não.

O olhar submisso abaixou para o lugar onde estava acostumado. Para o lugar onde ele achava que era o seu. Mas não era, de jeito nenhum. Eu tentei dizer com meu olhar que não podia ser sempre assim. Que não era pra ser. Mas ele tentou de leve, timidamente, me encarar. Mas a opressão estava tão estampada em sua expressão que não pude fazer muita coisa. Mas espero que ele encontre forças internas, onde ninguém acredita que tenha, para quebrar as correntes e seguir adiante. Independente. Dono de si. Do corpo. Da alma. De sua existência. Curtíssima.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Ânsia

A lealdade é mais fiel do que a ânsia de se aperceber daquilo que não se pertence ou não se almeja. Mas o que é a lealdade? Ora, é nada mais nada menos do que um cãozinho deitado na irradiante alegria de estar no mundo. De respirar e ser fiel à vida.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Na rodoviária

Não estava cheia, mas tinha gente. A minha matéria-prima. O que me alimenta a cada dia, mesmo que eu não veja tanta gente todos os dias. Não canso de repetir e frisar o quanto sou somado e somo com todos eles. Todos aqueles abraços, beijos, carinhos, felicidade do reencontro.

A espera.

Todos caminham de lá para cá. Olham para um grande painel. Uns apreensivos. Outros nem tanto. Atrasos e mais atrasos.

A chegada.

Os abraços apertados possuídos de muita saudade. Um casal de velhinhos que mal se enxergam mas se sentem profundamente ligados. Os reencontros de vidas. Os olhares. A expectativa da chegada.

Um beijo apaixonado.

Durou alguns poucos segundos. Uns 30 talvez. Não cronometrei, né? Mas era um beijo de paixão, saudoso de tempos bonitos vividos juntos. Pessoas que nunca vi, mas que partilharam comigo minutos tão preciosos. Não só para eles. Desconfio que sejam muito mais importantes para mim.

O mais importante é o que se pensa de si. Que os 'sis' das outras pessoas sejam guiados de forma autônoma, sem interferências de tantos outros 'sis' tão atrapalhados e disfarçados de boas intenções. O inferno. Cheio está.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

O menino e a pipa

Uma senhora desesperada. Nos seus olhos havia muita aflição. Tomara que o verbo esteja agora no passado. Tomara que tenha passado. É preciso reparar mais nos olhos daqueles, daquelas e daqueles outros ali.

Um menino brincava com sua pipa no meio da rua. O brinquedo era quase maior do que ele e o sorriso se expandia por seu rosto. A sua pele negra constrastava com aquele sol intenso de fim de tarde. Outro garoto, maior que ele, também brincava, pouco se importando com os anos e o tempo, e a idade.

Dois outros deles chamaram a atenção muito antes da imagem da pipa e do menino. Eram dois filhos e irmãos. Pelo menos é o que pareciam. Espiavam do portão, com muita cautela, como se escondessem de algo. Mas era realmente plausível que estivessem se escondendo de alguém, não de algo. Eles analisavam atentamente até que farejassem o melhor momento para a escapulida.

A rua é sempre uma fonte inesgotável de histórias e memórias.

Uma senhora que estava sentada na calçada batendo papo com as amigas olhou com atenção para a mocinha que passava na rua com um short curtíssimo, daqueles que os homens vêem até o útero. A expressão da mulher foi de surpresa e também de saudade. Eu fiquei imaginando se na época dela era possível, ou sequer imaginável, tal transgressão.

domingo, 11 de janeiro de 2009

Normal

...
- Não, estou falando de uma coisa normal.
- Como assim?
- Ah, você entende.
- Não, não entendo. O que é ser normal para você?
- Ah, você sabe né... Homem, mulher.
- Será que vale a pena essa discussão?
- Não estou discutindo nada, só estou falando o que penso.
- Seria melhor se esconder debaixo da cama então.
- O quê?
- É. Se esconder embaixo da cama desarrumada.
- Para quê?
- Para entender que não há nada normal.
- Então o mundo todo é bagunçado?
- Sem sombra de dúvidas.
- Até homem... e mulher?
- Claro. A cama simboliza exatamente isso.
- Então é tudo uma zona?
- Sim, até mesmo aquilo que tenta parecer normal é bizarro.
- Quem disse?
- Eu tô dizendo, ora bolas.
- Cada uma...
- A cada duas também.
- Acho melhor mudarmos de assunto.
- Tudo bem, mas acabaremos sempre na mesma anormalidade que é viver.
- Viver é um percalço enorme pelo qual todos temos que passar.
- Não disse? Você já está aí a devanear...

Intrínseco.

sábado, 10 de janeiro de 2009

Aquele domingo...

De repente, se lembrou das sensações que sentiu naquele domingo à tarde. Era um dia muito ensolarado de dois anos atrás. Os instrumentos ainda não tinham chegado. O sol batia com força e sem piedade sobre nossas cabeças. Todos ali eram estranhos e ao mesmo tempo conhecidos, irmãos de uma mesma realidade. A percussão começou dali alguns instantes. Os novos alunos estavam maravilhados com o som e com a oportunidade de sugerir um novo percurso e trajeto para as suas vidas. A emancipação de suas almas em torno da transformação do lugar. A arte. Os amigos. As coisas boas da vida. As memórias. Os ritmos. Os acordes. As batidas. As sonoridades. O colorido de tudo aquilo. A respiração descompassada. O alongamento que despertou uma surpresa no corpo e interferiu diretamente no pensamento. Ali era o começo. Do quê? Ele não sabia. Só sabia que era algo novo e digno de esperança e sucesso. Do abraço e receptividade plena alcançada naquele círculo, a lembrança permanece ainda em carne viva. Firme e forte e temperada de muitos sambas e afoxés. Batucadas. Venha. Continue. Pois a batucada ainda pulsa aqui em minhas veias.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Hélices

O helicóptero surgiu do nada pegando fogo e querendo engolir a tudo e a todos. Foi possível ver até os dois ocupantes, que não tiveram escapatória. O pânico se espalhou pela festa, foi uma correria só. Todos gritavam, apavorados, com a certeza de que a hora da morte havia chegado. Ele apareceu bem na hora que pularíamos na piscina e eu havia acabado de entregar o microfone para alguém, para não danificar. Depois de explosões seguidas e estilhaços para todos os lados, acho que todos ficaram vivos. É, acho que nem todos. Havia muito fogo.

E acordei do sonho. Lembrei!

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

O fruto

O fruto e a fruta saíram para desfrutar a frutificação de seus frutos. As sementes semearam sintomaticamente sertanejas flores santificadas pela sanção do povo. O povo proliferou a purificação no povoado cercado de podridão, mas tinha um punhado de possibilidades prestigiosas. A solicitude do bem-querer destrinchou o ditado popular e priorizou os mandados de busca e apreensão do primordial.

O gostoso da vida está em permanecer tocável e sociável, pois o alcance do sonho não pode ficar guardado em sonhos facilmente esquecíveis diariamente.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Destampando

O insano resolveu não se esconder mais dentro de objetos animados e foi procurar refúgio na floresta embrenhada no breu. A textura solidificada de consistências duradouras nunca foi tão belamente traduzida em tons e cheiros de pele...

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Percepções

O que estava aqui já esqueci. Mas retomo, ainda assim. Retomo, nem sempre confiante. Mas certo de que as coisas são mesmo esquecíveis. Você não acha? A idéia da alegria que pulula aqui e ali não distrai meu pensamento através e dentro de percepcões fictícias e vitalícias que contrói a identidade humana dentro do espectro formado por anseios, expectativas, dores e porquês.

Por quê?

domingo, 4 de janeiro de 2009

Gotas

Quem vem depois não sabe os traços que o guardou nos tempos passados no passado. Inspirado pela nuvem carregada não se atreve a sentir frio, apenas se entrega às vicissitudes do ser. Ouviu-se um barulho, algo ou alguém se arrastava molemente ao som de Doors. A abertura de Apocalipse Now ficou registrada em cada acorde e ângulo, não só visto mas também imaginado. Você escreve à mão regularmente? Eu nem tanto. Mas é tão bom... Me faz sentir vivo diante do tremeluzir da brisa despreocupada que invade o ambiente aqui sem pedir licença. A folha ainda está pela metade. A folha de papel, não a da árvore. A folha com a qual eu pensei em construir uma carta e uma casa; a carta foi, a casa ficou. O ritmo frenético também. Os dias passaram sem avisar que passariam. Rapidamente. O relâmpago. Os trovões seguidos do temporal e da dor na mão. A montanha, ou um agrupamento delas, se amontoa [claro!] diante de mim e mostra o seu mistério sensual escondido nas pedras. Formadas quando? Ontem, provavelmente. Mas eu sou atemporal. Sem tempo de discorrer sobre o que não é extremamente extremo e essencial. Dói muito. É preciso parar. Ejetar!

sábado, 3 de janeiro de 2009

Futebol

Ele nunca tinha sido muito bom de futebol, mas se esforçava lá do alto de sua pequena estatura. Era uma braveza só, mas nem sempre a vontade vence jogo né? Mas ele viu, à medida que o tempo passava, que ele não tinha o menor jeito para a coisa, que apenas jogava uma peladinha aqui ou ali para se incluir em um grupo, para fazer parte de algo. Mas antes de perceber isso, participou uma vez de um campeonato em sua escola. Devia estar no ensino fundamental ainda e tinha que comer muito arroz e feijão para conseguir vencer os melhores das outras turmas. Mas mesmo assim, ele montou um time-mirim junto com os colegas que jogavam mais ou menos também [tinha um ou outro que até jogava bem, viu]. Mas foi legal aquela fase. Ele sentiu o friozinho na barriga ao ver as arquibancadas lotadas na pequena quadra ao fundo da escola. O uniforme era improvisado, emprestado, sei lá o quê. Sei apenas que pairou a dúvida no ar: era melhor assistir ou atuar? Preferiu a segunda opção e foi lá tentar a sorte. Sim, porque precisavam de muita sorte para não levar uma lavada do outro time, que parecia mais experiente. O menino zagueiro tentou de tudo, mas não conseguia impedir que a bola chegasse até o goleiro, e em seguida até o fundo das redes. Um, dois, três, quatro... É melhor ter paciência. Foi um jogo rápido e fulminante. O resultado final foi algo em torno de 11 a 3. Pelo menos fizeram alguns golzinhos de honra.

Naquela época ele percebeu que sua força não estava nas pernas nem nos dribles e começou a tomar o seu rumo. O duro rumo da estrada tortuosa e cheia de calos e dúvidas. A estrada ainda é tortuosa, mas muitos calos já ficaram para trás. E não voltam mais. Não mais, não.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Singular

Sou único, porém influenciado por uma série de pessoas fora de série, das quais me alimento como se fosse um ser antropofágico, mas que não precisa de carne, apenas de palavras e carinhos para sustentar-se dos pés à cabeça desregulada e pronta para devanear por essas florestas adentro que parecem um mar sem fim, de respiração inspirada na calmaria mais plena de nossas vírgulas e pontos finais.

Observei a montanha ao longe cheia de nuves. Parecia que lá caía uma fina garoa. De repente, bateu um cheiro de protetor solar e logo uma avalanche de pensamentos foi desencadeada aqui. A vista da pousada não era lá tão boa, mas era possível ouvir o barulho do mar e imaginar os barquinhos velejando ao longe. A gruta ficou marcada na memória para sempre. O bom atrevimento de correr riscos e não ligar para quem pudesse julgar aquela relação de modo contrário ao nosso. A reunião em volta da mesa e os sorrisos exultantes, a falta de luz, o abraço aconchegante, os barulhos, os cheiros, os olhares, o clima. O amor.

Nostalgicamente ele deparou [mas não parou] com lembranças vindas naturalmente de recantos importantes e guardados especialmente. Instantes que fazem ele perceber que a vida não está sendo desperdiçada, que o dinheiro é apenas papel e vale muito sim, mas muito pouco se comparado ao preço que se paga para viver, um preço subjetivamente inquestionável.

A oferenda que ainda não quer voltar para os braços do mar é como a ponte iluminada por um sentimento áureo e fugaz.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Junto

A vontade de correr para o seio da família é mais forte do que a vontade do macho diante da fêmea no cio. Os exemplos são escolhidos por você, não impostos de maneira subjetiva. Então viva aprendendo que todo o aprendizado é insuficiente para se viver. Não há segredo nem sentido.

Simplesmente é coloquial e natural.

A vida.