Clima nervoso. Um pregador de espesso bigode negro, terno azul marinho e duas gravatas sobrepostas, e também sua característica pasta preta, passou a proclamar seus impropérios naquele trem improvisado de púlpito de sua igreja. Ele falou mal de atrizes, atores e prostitutas, dando a entender que todos que seguissem esse caminho estavam condenados ao fogo do inferno.
Disse também que a salvação só existia na pequena igreja [e grande negócio] de onde tinha vindo especialmente para converter os corações perdidos e contaminados pelas ruindades do mundo.
Na estação seguinte o trem estacionou na plataforma, e ele foi convidado a se retirar por dois passageiros, indignados com sua ação descabida de incomodar as pessoas dentro de um local de onde não dá para fugir. Foi dessa forma que ele parou de incomodar os passageiros com suas ladainhas infames e imbecis. Mesmo assim continuou a esbravejar a sua doutrina de botequim, enquanto saía e se afastava.
Dessa vez, fez-se justiça. Toda a cena tinha um quê de comicidade. Sua liberdade foi podada, e daí? A minha também foi, quando achou que eu estava disponível a ouvir suas falácias.
Bendito seja, estou salvo e para sempre liberto de todo o mal! Cada vez mais acredito que eu sou a minha religião e a religião sou eu apenas e a natureza também, na sua plenitude esplendorosa. Ela também me pertence, faz parte de mim, sou eu indiscutivelmente. Seu furor é meu e a minha força vem dela.
Experiências revoltantes fazem com que se busque com mais freqüência os direitos de cada um. O dele era de permanecer calado e não incomodar. O meu era de continuar lendo o meu livro em paz. Na próxima oportunidade, eu mesmo vou esbravejar: "Vá para o inferno com toda a sua imundície disfarçada de bondade e boas intenções!"
Ponto final para este arroubo de racionalidade embutida no ego despojado de quietudes.
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